Carta Pedagógica Distrito Federal e Entorno (07/2012)

Se, na verdade, não estou no mundo para simplesmente a ele

me adaptar, mas para transformá-lo; se não é possível mudá-lo sem um certo

sonho ou projeto de mundo, devo usar toda possibilidade que tenha para não apenas falar de minha utopia, mas participar de práticas com ela coerentes. (Paulo Freire)

Queridas/os Compas da Rede de Educação Cidadã/Popular,

 

Saudações daqui do Distrito Federal e Entorno que agora está bem frio e seco.

 

Antes de tudo, queremos compartilhar o desafio que é escrever e ao mesmo tempo a importância desse registro para nossa prática pedagógica. Escrevendo coletivamente essa carta, colocamos em prática um dos princípios da Educação popular, que é falar e levantar elementos da realidade da qual estamos inseridos/as, isso coerente com a nossa utopia, com a leitura crítica dessa realidade e compromisso com a mesma. Também, enquanto educadoras e educadores da RECID, não podemos deixar de buscar nos processos já vivenciados e sistematizados, no próprio Projeto Político Pedagógico, no Projeto popular para o Brasil, nas experiências dos vários coletivos, grupos e movimentos sociais que compõe e fortalece essa rede, para aqui relatar nossa vivência nos últimos meses no DFE.

Começamos o ano de 2012 bem intensos/as, já nos preparando para os encontros Macro Regional e Nacional. Esses dois momentos, nos provocou um esforço de avaliar o processo da RECID como um todo, foi com certeza um momento rico e ao mesmo tempo com alguns limites, dado que tudo aconteceu com pouco espaço de tempo entre um e outro, ainda tivemos que conciliar com as tarefas locais.  No final, tudo fluiu e conseguimos enquanto DFE fazer uma boa avaliação das políticas da rede e refletir isso na região.

 

Também os últimos meses foram tensos e intensos no âmbito da conjuntura política do DF como todas/os já vem acompanhando. A CPI do cachoeira chegou até o Governo do DF, um caso complexo e ainda em desvelamento. Fora esse caso em específico que não atinge somente o DF, temos claro a complexidade da conjuntura de um governo de aliança cheio de vícios problemáticos que se reflete nas fragilidades das políticas públicas da Capital do País e também no entorno dela, temos um sistema de saúde sucateado e insuficiente, um transporte público caro e precário, um avanço da especulação imobiliária principalmente nos Municípios do Entorno do DF entre outros. Contudo, não podemos deixar de relatar o esforço por parte de algumas secretarias do GDF em superar uma política assistencialista e corrupta que contamina todo o DF desde sua construção. Das parcerias encaminhadas com o GDF: Seminários, encontros e planejamento com a Sedest; moderação, facilitação e sistematização nos processos da Conferência de Cultura do DF e diálogo sobre a implementação do Orçamento Participativo, realizamos a seguinte avaliação:

 

● As conferências de cultura foram as mais participativas – referência de espaço de diálogo que continua ainda este ano de 2012.

● As parcerias consumiram muita energia, e as expectativas foram maiores do que se realizou.

● O tempo, a burocracia, mas principalmente a postura política do GDF praticamente inviabilizaram as parcerias.

● A Rede defende e luta na prática para construção de um projeto que o governo não dá suporte como um todo.

● Nos casos específicos das secretarias de cultura, de governo e de assistência social, há um esforço para encampar ações próximas do projeto da Rede, contudo, as disputas internas limitam seu campo de ação e dificultam muito nossa articulação e parceria com as mesmas.

● Temos que buscar uma articulação de outro tipo, menos ambiciosa, menor, que respeite o nosso tempo, nosso projeto e nossa capacidade de atuação.

 

Dando continuidade ao aprofundamento da metodologia da Educação Popular, realizamos o 3º módulo da escola da Educação Popular no DFE que é uma construção coletiva e teve seu início em 2010, fruto das experiências das Cirandas Nacionais, em especial a primeira que aprofundou a Educação Popular Critica Freireana e despertou no coletivo a necessidade de se fazer o mesmo movimento localmente, a fim de aprofundar o método da EP, seus princípios e desafios, e como colocar em prática nas ações. Contudo, tivemos um espaço de tempo entre o 2º módulo e o 3º de um ano, muito por conta da conjuntura política já partilhada acima. Avaliando criticamente que esse intervalo foi uma perca para o processo, mas que deveríamos continuar e fortalecer a proposta, nesse sentido, em março de 2012 realizamos o módulo com a chegada de novas/os atores que compuseram esse momento e tem dado o gás ao processo já se preparando para o 4º módulo.

 

Também desde o início do ano em articulação com a RECID – GO nos debruçamos na construção e realização do seminário interestadual sobre a realidade do entorno, com o tema: Criminalização da Pobreza, dos Movimentos Sociais e Extermínio da Juventude, fruto do último planejamento da RECID/DFE e consolidado no primeiro encontro interestadual DFE e GO em dezembro de 2011.

 

Para a realização do seminário interestadual, foi constituído um GT que iria animar e articular as ações levantadas no Encontro interestadual com o tema: “Góias não nos quer e DF não nos aceita”. As ações eram as seguintes: realizar oficinas sobre o tema, “Extermínio da Juventude” nas escolas públicas dos Municípios do Entorno e regiões administrativas do DF; realizar rodas de conversas com coletivos, associações, movimentos sociais entre outros; e também articular a sociedade civil organizada, entidades, movimentos, instituições públicas dentre outras/os para participarem do Seminário, no dia 26 de maio. Todas essas ações tinham caráter formativo para alguns espaços e de mobilização para todos.

 

Especificamente sobre as oficinas nas escolas dialogamos que seria bom ter uma motivação para os/as alunos/as. Nesse sentido, preparamos um concurso de redação sobre o “Extermínio da Juventude”. Tínhamos a intenção de dialogar no espaço da escola formal sobre a dura realidade que afeta diretamente o dia a dia dessa juventude. Nossas conversas se deram em torno do mapa da violência, da maioridade penal entre outros temas que os/as próprios jovens traziam, seja em suas falas significativas ou expressões de indignação.

 

Trabalhar com a juventude no espaço formal da escola foi de grande aprendizado e de fundamental importância para nós educadores/ as. Tivemos momentos de muita reflexão, e de adaptação à linguagem de uma juventude cheia de desejos e sonhos, mas que sem referências, busca visibilidade em uma estrutura social que cada vez mais nega seus direitos, tornado-a vulnerável a uma situação cada vez mais complexa e violenta.

 

Essa etapa “foi finalizada” com a realização do Seminário interestadual no espaço da Câmara Municipal de Luziânia, onde estiveram presentes diversos grupos e movimentos do DFE e GO, autoridades políticas do Município e os três estudantes que ganharam o concurso de redação, dois meninos e uma menina, todos/a de Municípios do entorno do DF. No seminário, saímos com o desafio de dar continuidade aos processos formativos no espaço da escola formal com as “caravanas culturais”, onde continuaríamos aprofundando o tema referente à juventude com atividades que dialogue com a linguagem do/a jovem: música, teatro, momentos lúdicos.

 

Esse
processo estar pensado a princípios nos seguintes momentos: preparação das oficinas, onde as/os educadores envolvidos terão momentos de estudo e preparo a partir da realidade de cada comunidade e escola, depois retorno as escolas com o tema proposto e por fim um dia comum na comunidade com atividades culturais envolvendo os/as jovens das escolas onde terão as oficinas. Todo esse conjunto está sendo chamando de caravanas culturais, usando o método da educação popular critico freireana, para aprofundar e conhecer a realidade da comunidade e fortalecer os laços para que superem as realidades de desigualdades. Queremos com isso, provocar o pensamento crítico e o protagonismo da juventude em sua realidade.

 

Mas recentemente, realizamos o Ocupa Centro Oeste no dia mundial do meio ambiente, 5 de junho. Essa ação é fruto de uma construção da região macro centro oeste, que tirou entre algumas ações essa de se realizar algo comum entre o DF e os Estados da região.

 

A Rede de Educação Cidadã do Distrito Federal e Entorno realizou na Rodoviária do Plano Piloto, centro de Brasília – palco de maior concentração da classe trabalhadora que passa todos os dias por este espaço para ir e vir do trabalho ou até mesmo para buscar sua renda ali mesmo. Foi nesse cenário que realizamos o ato “OCUPA CENTRO OESTE”, um ato político que tinha como proposta provocar as/os que passavam por lá a refletirem sobre nossa realidade, através de um manifesto que denunciava vários problemas, dentre eles o avanço do agronegócio. Também mais localmente aproveitamos para denunciar as péssimas condições de vida a que nós, moradores do Distrito Federal e Entorno, estamos sujeitos; falamos de lutas que perpassam as condições de um transporte de péssima qualidade, a luta incansável por moradia, o desrespeito com a educação e a saúde publica entre outras. Fizemos panfletagens e apresentamos o trecho de uma peça sobre agronegócio, do teatro do oprimido – realizado pelos/as compas do MST e do Levante Popular da juventude. Foi nesse sentido que saímos às ruas rumo a Rodoviária para dialogar e trocar “idéias” com os transeuntes que por ali passavam, a fim de buscar entender quais os anseios dessa população.

 

Assim como em outros momentos, esse também despertou em todas/os que participaram a motivação de dar continuidade ao ocupa centro oeste em datas representativas, onde possamos dar o grito da indignação frente às realidades que precisam ser desveladas e problematizadas no DF e Entorno.

 

Continuando a partilhar as ações desenvolvidas nos últimos meses, realizamos nosso planejamento de 2012 que teve dois momentos: no primeiro aprofundamos o que é planejamento participativo, os princípios e desafios da Educação popular, apresentação da RECID com sua estrutura, princípios e diretrizes, avaliação do ultimo planejamento realizado em 2011, análise de conjuntura e levantamento dos desafios da conjuntura. No segundo momento, a partir da síntese dos desafios, realizamos através dos eixos; formação e articulação política, Gestão e organicidade e Comunicação às ações que iríamos transformar em plano de trabalho, foi consensuado no coletivo que a articulação política perpassava todos os eixos, não centralizando somente na formação.

 

Por fim saímos com um calendário que conseguiu comprometer mais os coletivos que o construíram. Uma amostra disso é a articulação do encontro da região norte do DFE que envolve os movimentos sociais que lutam pela reforma agrária na região e outros grupos que desenvolvem trabalhos comprometidos com a educação popular e transformação social, MST, MATR , MTD, junto com a ECOA, Radio UTOPIA, CAMPANHA CONTRA AGROTÓXICOS E SINPAF.

 

Vale ressaltar que já estamos executando o plano de trabalho e teremos no dia 21 de julho nossa primeira reunião ampliada. Nesta reunião teremos um momento formativo de análise de conjuntura e avaliativo dos últimos meses desde o encontro de planejamento, ou seja, para a próxima carta já teremos também uma contribuição avaliativa de alguns processos tirados no planejamento.

 

Uma das atividades já executadas e em execução, que compõe o plano de trabalho, é o aprofundamento sobre “Gestão Compartilhada” e reuniões mensais de acompanhamento e avaliação da mesma. O objetivo da oficina foi provocar uma reflexão sobre o que é gestão compartilhada e preparar educadores e educadoras para o processo de planejamento, execução e prestação de contas das ações da Rede. Com isso, queremos fortalecer a ideia da gestão compartilhada na prática, desencadeando numa serie de processos reflexivos, desde leitura e analise dos relatórios pedagógicos, publicizar a prestação de contas mensal, decidir coletivamente como serão utilizados os recursos entre outros. Gerando um comprometimento e cuidado com o fazer da rede que deve sempre girar em torno da coerência pedagógica.

 

Outro momento importante foi à participação na Cúpula dos Povos, evento paralelo a Rio + 20, que aconteceu em junho. A Recid-DFE participou ativamente das atividades da Cúpula, incluindo uma roda de conversa realizada antes com os/as educadores/as sobre os temas que a cúpula provocava, a oficina da Rede sobre Educação popular e bem viver com a construção coletiva na região CO sobre o bioma cerrado, marchas e plenárias. Certamente foram dias de muito aprendizado e interação, a partir das atividades e especialmente, através da convivência com pessoas de toda a Rede e de todo o Brasil.

 

Por fim camaradas, os desafios são muitos. Internamente na RECID DFE avaliamos e estamos tentando superar a fragilidade de poucos momentos de formação da equipe, a centralização da Gestão, a organicidade da rede, a ampliação e participação dos movimentos no espaço da RECID (sentimento de pertença e articulação), entre outros. De forma mais externa, nosso desafio está na conjuntura política também.

 

Todos esses elementos nos provocam a questionar vários desafios: como incidir enquanto rede? Através do trabalho de base? Fortalecendo os espaços formativos e aprofundando a análise de conjuntura? Fortalecendo o diálogo com os movimentos sociais e os Governos do DF e Municípios do Entorno?

 

Entendemos que todas essas questões fazem sim parte do nosso papel enquanto educadoras e educadores populares, militantes da causa das/os oprimidos/as. Esses desafios impulsionam o nosso fazer e com certeza temos muito que avançar.

 

Estamos no caminho, e estar no caminho é estar em movimento, é sonhar com possibilidades de transformação, é agir para transformar, nesse sentido, o palavra de ordem, “ O povo que ousa sonhar, constrói o poder”, pulsa em cada uma/um de nós construtores/as dessa rede.

 

Com carinho revolucionário,

 

Educadoras e educadores populares da RECID/DFE ou RECID defé.

Um comentário em “Carta Pedagógica Distrito Federal e Entorno (07/2012)

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