Iniciativa da Secretaria Especial da Presidência da República, que acontece até dia 17 em quatro capitais, pretende usar o cinema para dialogar com a população e mostrar que os direitos humanos são de todos, e não só dos bandidos.
Bia Barbosa Carta Maior
SÃO PAULO Resultado de uma conspiração do bem. Foi assim que o crítico de cinema Amir Labaki definiu a Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul, da qual é curador e que foi aberta nesta sexta-feira (1) em São Paulo. O evento, de iniciativa da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, em parceria com o SESC/SP, acontece até o dia 17 de dezembro em São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro e Recife e tem como objetivo principal dar maior visibilidade aos direitos humanos na América do Sul. Ao todo, serão exibidas 28 produções de 10 países sul-americanos (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela) sobre temas como discriminação, acessibilidade de pessoas com deficiência, internos do sistema sócio-educativo e prisional, idosos, trabalho escravo e infantil, liberdade de expressão e exploração sexual de crianças e adolescentes. A prioridade concentrou-se na produção documental, mas há obras de ficção e animação no programa.
Para os organizadores, além da visibilidade que o cinema pode trazer à batalha pela defesa dos direitos humanos segundo Labaki, ausente da nossa sensibilidade o poder de convencimento da cultura é essencial neste campo.
Há no Brasil um bloqueio aos direitos humanos. Se fizermos uma pesquisa de massa, veremos que a sociedade compreende os direitos humanos como os direitos de bandidos. Então a idéia é pegar o cinema para falar de direitos humanos como uma celebração da vida, da proteção dos discriminados e dos excluídos, como parte do cotidiano de todos, explicou o ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), para quem a iniciativa é um incentivo para a transformação da consciência que nos falta ou falha.
Na opinião de Luiz Deoclécio Massaro Galina, diretor em exercício do SESC São Paulo, é preciso ir contra a corrente que comercializa a cultura através dos estereótipos e assim alimenta o preconceito, as violações, a intolerância. A cultura que educa é aquela que nos provoca, alenta a reflexão, nutre o silêncio vertical. Se difundimos o bom cinema, ou qualificamos esta ou aquela obra de arte, é porque eles sempre operam enviesando o mundo, tencionando a realidade, abrindo-nos para o diverso. Nesta mostra a realidade é retratada pelos olhares dos diretores que politizam os abusos, desrespeitos e violências dirigidas contra a humanidade periférica, o lado sul do mundo. Tal mostra não deve ser pensada só como denúncia pontual, mas como nosso permanente compromisso de agir em nome dos direitos e das liberdades humanas, afirmou.
A poucos dias da comemoração do Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado em 10 de dezembro, a Mostra que defende uma atenção permanente a todas as formas de opressão, com o objetivo de eliminá-las ou coibi-las também pretende ser um espaço de troca da cultura sul-americana, ao exibir obras de países que ganham pouco espaço nas telas nacionais, como é o caso da Bolívia e do Equador.
Estão no programa, por exemplo, O Comitê, do Mateo Herrera, que retrata o dia-a-dia dentro do presídio Garcia Moreno, a principal penitenciária de Quito. Em um dia de visitas, ocorre uma greve na qual 370 pessoas são feitas reféns. E The Real Thing: Coca, Democracia e Rebelião, documentário de Jim Sanders que investiga a guerra às drogas promovida pelos Estados Unidos e o impacto que ela tem na vida dos bolivianos, especialmente dos cocaleros, indígenas cultivadores da folha na região de El Chapare, onde a planta é sagrada, reverenciada e usada pela maioria da população.
Ao estimular uma aproximação entre os países sul-americanos e o maior conhecimento de suas realidades, a mostra se propõe a ser um canal de discussão sobre problemas comuns do continente. Todas as sessões são gratuitas e a programação está disponível no site da mostra (leia aqui). No próximo ano, a idéia é estender o projeto a Salvador Belém e Belo Horizonte. Como conclui Carlos Magalhães, diretor executivo da Cinemateca Brasileira, parceira do evento, a esperança é que essas discussões passem a fazer parte do nosso passado e não sejam mais a necessidade do nosso presente.