Formação constante para professores

O educador Paulo Freire sempre destacou a importância de valorizar e respeitar o trabalho do professor. Para ele, a formação permanente é essencial para garantir a qualidade da educação. É o que mostra a segunda matéria da série Paulo Freire, o mestre do mundo, idealizada para marcar os 40 anos do livro Pedagogia do Oprimido, obra mais importante dele. Os textos são de Margarida Azevedo.

A afirmação de Paulo Freire de que a educação é um ato de amor nunca esteve tão atual. Diante de problemas como alunos desestimulados, pouco incentivo à carreira e escolas com precária infra-estrutura, os professores têm que se apegar à amorosidade defendida por ele para, mesmo em condições adversas, exercerem o magistério. Reconhecer e valorizar o trabalho do educador, com foco na formação permanente, é um dos caminhos para melhorar a educação brasileira, alerta dado por Freire há mais de 20 anos. “É urgente que o magistério seja tratado com dignidade. É bem verdade que a educação não é alavanca da transformação social, mas sem ela essa transformação não se dá.”

Com a mesma profissão do pai, a filha mais velha do educador, Madalena Freire, segue o raciocínio dele. “O professor deve ter formação permanente, com acompanhamento pedagógico, com reuniões no máximo quinzenais. Encontros para discutir a prática, para fundamentar com a teoria. O professor tem que ser escutado, visto, reconhecido como peça fundamental na educação”, destaca Madalena.

Vinte anos em sala de aula e o sentimento de frustração. “Sou apaixonado pela minha carreira. Mas a falta de reconhecimento financeiro inviabiliza um trabalho de qualidade, o que não significa comodismo de minha parte. Os governos não dão condições. Tenho que ser um artista para trabalhar”, desabafa o docente de física e matemática Eduardo Botelho, 38 anos. Ao observar o malabarismo que ele faz para somar R$ 2.600 no fim do mês, percebe-se que sua afirmação não é nenhum exagero.

Eduardo atua em três escolas, duas públicas (uma do Estado e outra da rede municipal de Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife) e uma particular, além de manter vínculo com a Universidade de Pernambuco (UPE). Trabalha de segunda a sábado, em três turnos. “Sou apaixonado sim pelo que faço”, repete, “mas não sou burro. Estou me preparando para deixar a sala de aula. Acho válido Paulo Freire dizer que somos agentes de transformação, mas não dá mais para continuar”, comenta.

Professor de matemática da rede municipal do Recife, Iran Pessoa, 55, também reclama do baixo salário. Mas sua queixa maior diz respeito ao modelo de avaliação adotado pela prefeitura. “Não existe reprovação por desempenho. No sistema de ciclo, o aluno vai ser aprovado, mesmo que não tenha aprendido. Mesmo que falte às aulas. É como se rasgassem meu diploma. Isso é uma falta de respeito conosco”, destaca Iran. “Sou viciado em sala de aula. Adoraria fazer uma pós-graduação, mas não tenho como pagar. Se pudesse voltar no tempo, escolheria outra profissão.”

Para Freire, apesar das dificuldades, os professores têm que se empenhar na tarefa de educar. Sobre o desânimo e a vontade de desistir por causa dos baixos salários, ele escreveu em um de seus livros: “esta é, na verdade, a posição mais cômoda, mas é também a posição de quem se demite da luta, da História. É a posição de quem renuncia ao conflito, sem o qual negamos a dignidade da vida.”
POLÍTICA PÚBLICA – A vice-diretora do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e defensora do pensamento freiriano, Eliete Santiago, diz que o maior problema na educação é a falta de uma política global para os docentes. “Tem que garantir o acesso, as condições de permanência, a formação continuada e bons salários para os professores. Eles têm que se reconhecer como parte importante para o desenvolvimento do País.”

Durante sua trajetória como educador, Freire sempre demonstrou preocupação com a formação docente. Na década de 50, quando atuou no Serviço Social da Indústria (Sesi), no Recife, ele redigia cartas para os mestres, levantando questões pedagógicas para serem refletidas. Como secretário municipal de Educação de São Paulo (1989-1991), tinha como um dos eixos de atuação a formação dos educadores. “Na sua gestão, o docente era ouvido. Ele fazia questão de conversar, de escutar o professor”, lembra a educadora da Universidade Católica de São Paulo Ana Maria Saul, que trabalhou com Freire na secretaria.

Alfabetizada aos seis anos, em Angicos (RN), a pedagoga Maria Eneida de Araújo, 52, pediu ao presidente João Goulart, durante visita à cidade, em 1964, uma bolsa para carregar os livros. Três décadas depois, ao receber Paulo Freire no município e questionada o que pediria a um presidente, se tivesse nova oportunidade, Eneida foi taxativa: “Mais respeito com o professor, para que ele tenha mais dignidade”.

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