O momento histórico é de construção. Nada está pronto, como, aliás, aprendeu-se em décadas de luta popular e organização do povo trabalhador. É um permanente caminhar, onde não há receitas definitivas nem modelos pré-estabelecidos. O processo popular acontecido e em acontecimento no Brasil tem características próprias e peculiares. Se nada está pronto, é preciso fazer acontecer.
O momento histórico é de construção. Nada está pronto, como, aliás, aprendeu-se em décadas de luta popular e organização do povo trabalhador. É um permanente caminhar, onde não há receitas definitivas nem modelos pré-estabelecidos. O processo popular acontecido e em acontecimento no Brasil tem características próprias e peculiares. Se nada está pronto, é preciso fazer acontecer. Por outro lado, como não há modelos, há o risco de errar, de ir por trilhas equivocadas. A crítica e auto-crítica permanentes, para quem está na educação popular, são fundamentais, até decisivas. Por vezes, pode ser mais lento e mais custoso, mas é com certeza mais duradouro e consistente.
O eixo central do segundo governo Lula é DESENVOLVIMENTO COM DISTRIBUIÇÃO DE RENDA E EDUCAÇÃO DE QUALIDADE. Desenvolvimento significa pensar um projeto de desenvolvimento. Não é, com certeza, qualquer projeto, pois este desenvolvimento terá que ser com distribuição de renda, num dos países de maior concentração de renda do mundo. Para distribuir, é preciso alguém perder para muitos ganharem. Distribuição de renda significa eqüidade, eqüidade significa para todos, para todos é inclusão social, inclusão social significa envolver todos e garantir dignidade, dignidade são valores humanos, são valores sociais, são valores ambientais, são valores culturais. Falar em desenvolvimento com distribuição de renda significa ter lado na sociedade, voltar-se para os excluídos, para os mais pobres entre os pobres. Educação de qualidade significa envolver o conjunto da população em acesso à educação. É, portanto, a escola formal e a educação popular. É recolher o aprendizado de décadas dos movimentos sociais, das ONGs, das pastorais populares para que contribuam na educação de qualidade.
A construção de um projeto de desenvolvimento com distribuição de renda não acontece sem o envolvimento de governos, especialmente o federal, e o da sociedade civil organizada. O Brasil não tem uma história de construção nacional consolidada. As elites brasileiras movimentaram-se e fizeram política, ao longo dos séculos, de forma patrimonialista ou assistencialista, ou os dois modelos combinados. O povo nunca teve verdadeiramente espaço, nunca foi protagonista. Por isso mesmo nunca se colocou no cenário um projeto de desenvolvimento nacional, muito menos com distribuição de renda.
Há uma oportunidade histórica que não pode ser desprezada. O povo trabalhador precisa tornar-se protagonista do processo.
Os pobres sempre foram muito pobres no Brasil, mas desde o advento do projeto neoliberal, com Collor e FHC, além do desmonte do Estado, houve um empobrecimento geral do povo brasileiro. O desemprego passou a ser brutal, a renda da população despencou, o salário mínimo chegou a valer 50 dólares, não conseguindo nem comprar uma cesta básica. O neoliberalismo trouxe junto a favelização das grandes cidades, a violência e a criminalidade, a perda de referências e valores baseados na dignidade humana, na solidariedade, na cidadania.
Hoje 80% dos brasileiros ganham menos de 3 salários mínimos e são pobres. Destes, dezenas de milhões, identificados nas 11,1 milhões de famílias que são beneficiárias do Bolsa Família, beiram a miséria e a indigência. Esta é a realidade brasileira.
Os mais pobres entre os pobres nunca tiveram oportunidade, vez e voz. Em primeiro lugar, é preciso reconhecer seus valores, sua cultura, suas tradições. Em segundo, dar-lhes oportunidades de se expressar, de dizer o que pensam, como sobrevivem, como são seres humanos que pensam, que constroem, que sonham, mesmo nas condições em que estão e tentam viver. Em terceiro, são milhões e precisam dar-se conta de sua força política. Se estiverem organizados, se tiverem voz própria, serão uma força poderosa de mudança, de exigir o desenvolvimento com distribuição de renda e educação de qualidade.
As diferentes organizações sociais que trabalham com educação popular e envolvem a população mais pobre precisam articular-se entre si, partilhar suas experiências, construir juntos. E articular ainda as experiências da economia solidária, os novos movimentos sociais como os dos recicladores e catadores, os das mulheres, os dos desempregados, os dos indígenas e quilombolas, dos albinos, entre outros, que nos últimos vêm-se se constituindo no Brasil e somando-se aos já tradicionais, como o movimento sindical, a CUT, os dos sem-terras, o MST, os dos pequenos agricultores, como o MPA e da FETRAF, os da luta por moradia e saúde.
É preciso também (re)inaugurar práticas cotidianas de educação popular, seja recuperando a pedagogia freireana, seja construindo a educação popular à luz do momento histórico que não é o mesmo dos anos 60 ou 80.
Ouvir o povo, reconhecer sua diversidade cultural, conhecer os vários países que existem dentro do Brasil, (re)aproximar-se da América Latina é tarefa dos educadores que sonham com a mudança.
A história brasileira talvez nunca tenha colocado perspectivas tão promissoras quanto para 2007 e anos seguintes. Há uma energia positiva no ar, a auto-estima do povo, especialmente do mais pobre, está fortalecida e revigorada, há um governo que, embora de coalizão e com algumas contradições, volta-se para o país e o povo trabalhador.
Na América do Sul e América Latina, uma onda de vitórias populares com governos de esquerda e centro-esquerda permite pensar em avanços no Mercosul e na construção da Comunidade Sul-americana de Nações.
Trata-se agora de estar à altura do momento histórico, de ajudar os pobres a serem protagonistas, de acreditar e lutar de novo pela mudança e transformação econômica, social e cultural do Brasil.
Selvino Heck
Assessor Especial do Presidente da República
Janeiro de 2007