Rescaldos do Fórum Social Mundial

Domingo, primeiro de fevereiro, chego no aeroporto de Belém para embarcar para Brasília. Encontro Frei Betto, Nilmário Miranda, presidente da Fundação Perseu Abramo, Hamilton Pereira, hoje na Agência Nacional de Águas, Milton Rondó, do Ministério de Relações Exteriores, Vidal da Petrobrás, Rosângela Rossi, do Programa Escolas-Irmãs, o educador Oscar Jara, entre outros companheiros. Nas conversas, o Fórum Social Mundial (FSM) recém terminado: avaliações, sentimentos e preocupações com o futuro.

Domingo, primeiro de fevereiro, chego no aeroporto de Belém para embarcar para Brasília. Encontro Frei Betto, Nilmário Miranda, presidente da Fundação Perseu Abramo, Hamilton Pereira, hoje na Agência Nacional de Águas, Milton Rondó, do Ministério de Relações Exteriores, Vidal da Petrobrás, Rosângela Rossi, do Programa Escolas-Irmãs, o educador Oscar Jara, entre outros companheiros. Nas conversas, o Fórum Social Mundial (FSM) recém terminado: avaliações, sentimentos e preocupações com o futuro.

Todos concordam: houve um resgate da idéia original do Fórum; esta edição foi a mais importante desde a primeira em Porto Alegre, 2001.

Para qualquer lugar que se fosse, havia gente, muita gente. Painéis, palestras e seminários lotados, muitas vezes superlotados (um, com a participação de Frei Betto, diante dos protestos gerais, acabou acontecendo na rua, debaixo das árvores e sob sol forte). Assuntos e temas os mais variados, embora alguns dominantes, como a questão ambiental e a ecologia, a América Latina e suas mudanças, a crise econômica e o futuro.

A Rede TALHER de Educação Cidadã (RECID) promoveu um Seminário sobre Democracia e Participação social na América Latina, com participação de Frei Betto, do ministro Paulo Vannuchi dos Diretos Humanos e Diego Pari, vice-ministro de Educação Superior da Bolívia na simbólica tenda Irmã Dorothy. Mais de mil pessoas presentes, clima de alegria, música, cantos, danças, a ponto do ministro Vannuchi comentar que parecia uma festa ou uma celebração. Digo que a Rede assim trabalha a educação popular e cidadã em todo Brasil. (Quem quiser uma notícia, procure em www.youtube.com.br – link pesquisa Educadores no FSM.)

O grande debate, diante da crise econômica mundial que é reflexo e resultado do fracasso do modelo capitalista neoliberal, é sobre o futuro. Ou seja, como será ‘o outro mundo possível’? As experiências do passado, do Leste europeu, energias e sonhos de muitos lutadores e lutadoras, acabaram com a queda do Muro de Berlim: não havia a liberdade e a igualdade sonhadas, o Estado onipresente matou a democracia e a participação popular.

Agora parece abrir-se uma nova oportunidade, quando o dito pensamento único que dizia estarmos no fim da história mostra o desastre a que levou a humanidade: concentração de renda, fome e miséria de um bilhão de pessoas no mundo, o planeta à beira de uma catástrofe ambiental. E a sensação ou certeza de que ou mudamos já, ou não se sabe o que será de nossos filhos e netos: em que país e planeta viverão e sobreviverão, com quanta água e ar, com quais valores.

O encontro dos 5 presidentes – Lula, Chávez, Evo, Correa e Lugo – foi emblemático, além de um acontecimento inédito e forte politicamente. Primeiro escutaram palavras, muitas vezes duras, de movimentos sociais e mulheres: o papel dos governos, a construção da democracia, o protagonismo dos pobres e trabalhadores. Depois, falaram, cada um na sua prática e visão, sobre o que estão fazendo e sobre o que pensam do futuro. Todos condenaram a proposta neoliberal de um Estado mínimo e de que o deus mercado resolveria todos os problemas. Disseram que os pobres e trabalhadores não poderão e não irão sofrer as conseqüências de um modelo econômico-social que privilegiou o enriquecimento de poucos. Alguns avançaram no debate sobre o que seria o socialismo do século XXI. Ficou, com certeza, a idéia de que os 5 presidentes e seus governos estão unidos na idéia de uma América Latina soberana e propulsora de um projeto de desenvolvimento diferente do que vem sendo implantado nas últimas décadas. O que, convenhamos, não é pouco.

O desafio do futuro permanece e torna-se urgente. O Fórum Social Mundial de Belém foi um momento de avanço, onde as perplexidades de 2001 começam a se fazer realidade e propostas concretas em 2009. Há mudanças na América do Sul e no mundo e o FSM refletiu, felizmente, este contexto. Embora não seja ainda, nas palavras do presidente Rafael Correa, uma mudança de época em vez de uma época de mudança.

Há um longo caminho a percorrer. Mais debates, mais fóruns, mais governos democráticos e populares, e melhor se socialistas, mais organização popular são necessários, imprescindíveis. De tantos debates, de tantas falas, de tantas reflexões e textos durante e depois, ficou a impressão de que as propostas, muitas vezes, ainda são muito genéricas ou pontuais. Não há ainda caldo suficiente para uma proposta global que responda suficientemente aos grandes desafios da hora presente: qual o novo modelo econômico; como enfrentar o poder do capitalismo financeiro e das transnacionais; como ligar um projeto de desenvolvimento global e nacional com o local que instrumentos garantem democracia e participação popular num mundo onde a informação é global; como garantir o respeito à natureza mantendo a qualidade de vida e os avanços tecnológicos; como construir valores de solidariedade, partilha, igualdade num mundo onde o individualismo pregado pela comunicação de massa predomina.

O Fórum Social Mundial refletiu muitas das perguntas cruciais do mundo de hoje e dos que querem ‘um outro mundo possível’. As respostas, seja no campo teórico, seja no prático e na vida, começam a aparecer. Mas é preciso avançar muito na organização popular, recuperar a educação popular como espaço de reflexão e construção, fazer experiências concretas no campo econômico e social, como a economia popular, e com governos democrático-populares, construir uma nova hegemonia econômico-social-cultural.

Existe esperança. Existe futuro.

Selvino Heck
Assessor Especial do Presidente da República

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