Recid Roraima e a Educação Popular em Raposa Serra do Sol

Nas comemorações de 1 ano da homologação de Raposa Serra do Sol, educadores/as populares relatam as experiências na região e a importância de acreditar na luta e na construção de um sonho comum.

 

Vários parentes ficaram pelo caminho vitimas da violência. Lágrimas e sangue foram derramados em nome da determinação de que era possível reaver as terras invadidas ou tomadas por fazendeiros que só queriam ficar ricos”.

 

O dia 19 de abril de 2010 para nós da Rede de Educação Cidadã Roraima não significa apenas um fato histórico, representa um momento impar na vida de quem acredita que vale a pena insistir na luta, na militância, na utopia, no sonho comum.  

Neste sentido, participar da festa de comemoração dos netos de MAKUNAIMI em prol de um ano da homologação das terras indígenas da Raposa Serra do Sol, na região do MATURUCA, coração da região, é trazer presente o companheiro de sonhos e lutas, Valdir Benício, afinal, este foi um grande incentivador e mobilizador para que chegássemos a essa região do estado de Roraima. Para nós essa festa é uma conquista de muita luta, de sangue derramado, de violência, de perdas de vida de 21 homens, afirma a educadora Ioná Brasil.

Podemos afirmar que os momentos experimentados, vivenciados nestes dias na Raposa Serra do Sol, não se explica, se vive a beleza e a mística que envolve a região. É neste clima de sedução que podemos nos perguntar, o que nos garantiu estarmos nesta festa e em outros momentos como as assembléias indígenas, na região da Raposa Serra do Sol? Vejamos, desde 2005, estamos experimentando este processo junto aos indígenas, mas de fato, podemos afirmar que foi a partir de 2007 que iniciamos momentos de formação com a presença dos indígenas, especialmente juventude e mulheres. 

Vamos fazer memória e destacar que em 2006, num dos encontros nacionais, o educador Valdir buscava nos sensibilizar em relação àindígenas dessa região se encontravam e do quanto era importante que a RECID abraçasse a idéia, afinal cuidar da Amazônia  seria responsabilidade de tod@s brasileir@s.

Em 2008 no encontro estadual, a RECID pautou a temática da luta pela homologação das terras indígenas e deste foi encaminhado que teríamos que levar para o encontro nacional a campanha. Assim, no encontro nacional realizado na chácara do CIMI, o educador Hudson Dioniso – indígena Macuxi, levou a mensagem e buscou sensibilizar e mobilizar os educadores(as) da RECID acerca da realidade em que estava a luta da homologação das terras da Raposa Serra do Sol. Este teve um papel importante naquela altura, conhecedor da causa, militante e atuante no Conselho Indígena de Roraima-CIR, nos mostrou de fato o porquê da luta, desconstruindo a leitura que a mídia nos mostrava, e foi assim, que ganhou alguns adeptos para a causa dentro da Rede de Educação Cidadã em âmbito nacional.

Os anos de 2007 a 2009, foram importantes para a RECID Roraima no sentido do coletivo de educadores perceberem que não daria para desenvolver processos de educação popular na região, ignorando os indígenas. Tínhamos que chegar a esse universo e chegamos via a parceria com a Equipe Itinerante da Diocese de Roraima, Movimento de mulheres indígenas, Conselho Indígena de Roraima, Centro de Migração e Direitos Humanos.

Para a Rede de Educação Cidadã, desencadear processos de formação de educação popular junto aos povos indígenas, é um grande desafio. Nessa perspectiva, a equipe de Roraima, percebeu que o mais coerente seria que a formação fosse realizada por quem de fato conhece a causa de perto. Sendo assim, trouxe para a equipe de educadores(as) contratados, indígenas, cabendo a estes, assumirem os processos nos municípios: Pacaraima e Uiramutã, região do Surumu – Comunidade do Barro (comunidade situada na região da Raposa Serra do Sol),  no município do Amajari – terra indigena Ponta da Serra, como também na cidade de Boa Vista, junto a organização dos índios da cidade, em parceria com a pastoral indígena.

Na região do Surumu, comunidade do Barro, busca a formação com juventude e lideranças da comunidade. Por que juventude e lideranças? Segundo o educador Hudson Dionísio, o que vivenciamos é a descrença da juventude junto às lideranças. Por isso buscamos a formação de novas lideranças na perspectiva de atender as exigências da juventude, que vai desde a consciência e coerência entre o fazer e o agir. Os jovens querem acreditar no trabalho das lideranças. Com o trabalho que a RECID desencadeia no campo da educação popular, busca junto aos jovens novas lideranças. A educação popular é o instrumento que pode gerar novas consciências, além de não deixar a utopia morrer. O trabalho de luta, o estar à serviço de seu povo, compromisso com suas causas, não se deixar ser cooptado pelos ideais falsos, do consumo, é um desafio a ser vencido. O trabalho com a juventude é desenvolvido em parceria com o centro de formação da Raposa Serra do Sol e abrange jovens de 17 a 25 anos, sempre na perspectiva de novas lideranças.

No Município do Amajari , terra indígena Ponta da Serra, os processos estão sendo desenvolvidos junto ao povo indígena Macuxi, perpassando pela formação com mulheres, juventude e crianças, um trabalho no campo da segurança alimentar dialogando com a produção local e em parceria com a Equipe Itinerante.

Neste sentido, para a RECID marcar presença com 11 educadores(as) e mais Selvino Heck e Vera Lúcia Barreto na festa de comemoração de um ano da Homologação, representa uma conquista, um sonho realizado, um compromisso com a luta e com os povos indígenas que  vivem na região da Raposa Serra do Sol (Macuxi, Wapichana, Ingarikó, Taurepang, Patamona,), além de ser um momento para se vivenciar a cultura, a vida, de conhecer de perto os desafios e limites para se fazer educação popular numa região como a da Raposa Serra do Sol.

A história dos 34 anos de luta da conquista da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, não termina aqui, pelo contrário, estamos começando. Para a RECID RR, é cada vez mais exigente o fazer pedagógico junto aos povos indígenas. O diálogo, a parceria, as mobilizações e articulações entre os organismos, movimentos, pastorais, fóruns que ao longo da luta buscam desenvolver processos de educação popular devem ser intensificados e aprofundados na perspectiva de envolver cada vez os protagonistas dando voz e vez a estes.

Para a RECID RR cabe agora pensar momentos de forma&ccedi
l;ão que possam  contribuir para os desafios que a Raposa Serra do Sol enfrenta, como buscar alternativas para a auto-sustentação econômica, sem jamais perder de vista o respeito às especificidades locais e os anseios das comunidades, como também o Projeto Político Pedagógico que deve iluminar as ações realizadas pela rede.  

Concluímos a experiência vivenciada nesses dias de comemoração dos netos de MAKUNAIMIN na Raposa Serra do Sol, com palavras do educador Hudson Dionísio, que afirma que este momento representa uma  conquista da luta organizada, de respeito ao estatuto do índio e a própria Constituição, afinal, as leis devem ser cumpridas e respeitadas, brigamos e lutamos pelo que é nosso, reivindicamos o que é nosso, mas também ressaltamos o reconhecimento do Supremo Tribunal Federal que deu direito a terra aos verdadeiros donos desta.

 

Boa Vista, 23 de abril de 2010.

Por Vera Lúcia L.Barreto com colaboração dos educadores Ioná Brasil, Idalina e Hudson Dionísio.

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