Carta Denúncia Sobre a Conjuntura de São Paulo

Aos companheiros e companheiras da RECID

Esta carta vem em meio a uma conjuntura massacrante de SP, estamos escrevendo para partilhar situações, episódios e encaminhamentos que temos tido ao longo destes últimos meses de modo especial.

Em uma suposta guerra com uma possível facção criminosa, parte da Polícia Militar está envolvida numa onda de assassinatos que já fez dezenas de vítimas, elevou em quase 100% o índice de homicídios no Estado e aterroriza as periferias. As periferias que vem sendo citiadas, invadidas dia após dia, sem nenhuma explicação pertinente, a explicação que a nosso ver e de tantos outros movimentos não cabe que as comunidades (favelas) estão sendo ocupadas para manter a ordem e descobrirem que são os mandantes das cerca de 90 mortes dos policiais, porem não vemos o mesmo acontecer em prol das quase 1400 mortes oficiais de civis, dentre estes mais de 70% homens, jovens, negros e moradores de periferias.

O crime dos civis tem tido pouco ou nenhuma divulgação, estamos vivendo em SP quase dentro de um estado de exceção onde o direito de ir e vir vem sendo tolido dia após dia com toques de recolher em diferentes momentos do dia, até onde temos acompanhado estes mesmos toques não é dado pelos “supostos criminosos” e sim uma orientação da policia militar, as famílias estão ficando amendrotadas a ponto de evitarem que seus filhos saiam de casa e vão seja para a escola, seja para umas oficinas, seja para uma atividade cultural, os espaços de cultura (saraus) da região do distrito do Jardim Ângela quase em sua totalidade vem sofrendo represarias para se manter fechados de modo especial aqueles espaços que combatem a política do então governo estadual.

 

Precisamos fazer ecoar as dores das mães que vem perdendo seus filhos desde 2006 quando cerca de 500 pessoas foram assassinadas entre sociedade civil e funcionários da segurança pública, sequer as investigações seguiram e hoje novamente se repete os mesmos atos de violência. Precisamos fazer ecoar as vozes de centenas de mulheres de denunciam o envenenamento de seus pares nos Centro de Detenção Provisórios, presídios e colônias de segurança pública.

Ocupar as nossas comunidades assim como fizeram no RJ no nosso entendimento reforcará as políticas punitivas que tem produzido a atual conjuntura. Nos últimos 20 anos o governo do estado vem tendo uma expansão vertiginosa triplicando o número de vagas em detrimento de alternativas educacionais. Na administração pública assistimos uma militarização sem precedentes nas nossas periferias vivemos o misto da ausência do estado (provedor) e excesso do estado (punitivo) que aqui se efetua em dupla articulação: aprisionamento e extermínio. Denunciamos nestes últimos meses em diferentes frentes, esferas e espaços que está dupla via se dá com a policia oficial (fardada), por outro através dos grupos de extermínio formados por uma parcela desta mesma policia, explicitamos que o alvo desse excesso tanto pelo aprisionamento ostensivo quanto pelo extermínio sistemático são aqueles que podemos identificar sob três adjetivos: pretos, pobres e periféricos.

Por tudo relatado acima entendemos que a opção do governo federal não deve ser uma mera soma ás políticas punitivas que vem sendo levadas pelo governo estadual, mas contribuir para barrar a política de extermínio, pautar o governo para que tenhamos uma política de segurança publica baseada na defesa e não na violação de direitos. Este último ponto não é uma tarefa exclusiva de gestores públicos, mas um compartilhamento com os Outros – os presos, os nóias, os moradores de rua, os moradores das periferias, enfim todos aqueles e aquelas que moram no estado de SP e que vem dia após dias vendo seus direitos violados. O que pedimos não é uma soma fácil, repetitiva a toque de caixa. Pedimos uma nova soma: que ao invés de subjugar ainda mais estes Outros, que os tragamos para isto que chamamos de democracia.

Assim nós da RECID e de tantos outros coletivos partilhamos nossas dores, preocupações e anseios em como consta em O Embaixador “ Achavam-se agrupados e presos a terra, por uma raiz comum, como uma moita de bambu. E, como esse vegetal, inclinavam-se e dobravam-se. Mas sobreviviam ás maiores tempestades”. (Morris West), assim estamos todos neste momento, inclinamos as vezes, sofremos baixas em outras, mas sobreviveremos.

RECID – SP

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